CARAS E BOCAS
Diga-me
com quem andas e eu te direi quem és. Dito popular mais antigo que os velhos e
rudimentares sabonetes Eucalol que esfregou a pele de muita gente nesse país lá
pelos idos dos anos 60/70 do século passado.
Igualmente
vale a frase: diga-me como julgas seu sistema de justiça que eu te direi quão
picareta pode ser seu país.
O Supremo
Tribunal Federal em voto final deu sentença favorável aos tais embargos
infringentes do processo do Mensalão e fechou o placar em 6x5 a favor dos vis
assaltantes, corruptos, sujos, feios e malvados.
Valeu
o crime. Mas não aquele de roubar um pão na padaria, esse o motivo de quase
toda uma peça de ópera chamada Os Miseráveis escrita por Victor Hugo em 1762.
A ópera
conta a história de um ladrão, Jean Valjean, que acabou servindo durante 19
anos nas galés (cinco por roubar um pão para sua irmã e seus sete sobrinhos
passando fome, e mais catorze por inúmeras tentativas de fuga). Isso mesmo 19
anos por roubar um pão.
O
mensalão foi o mais absurdo esquema na história moderna do Brasil sobre como
roubar um país de ponta a ponta distribuindo o produto dos assaltos por uma
cadeia interminável de pessoas. Todas elas proclamadas inocentes perante o
possante e inútil tribunal de justiça de exceção brasileiro torpedeando de
frente a vergonha nacional numa explosão cataclísmica de capital importância
para a definição da famosa frase que abre este arrazoado.
Para
que nos serve um pomposo, rico, poderoso sistema de justiça maior brasileiro, o
tal Supremo Tribunal Federal? A corte maior sujou a bandeira com uma mácula que
nunca mais poderá ser removida.
Jogou
lama na honestidade do povo brasileiro num arcabouço de vocabulês irritante,
firulas tripudiantes jurídicas, protocolizando um passaporte para sermos um
Brasil de justiça haitiana, venezuelana, boliviana, coisa de terceira classe
com louvor.
Os
justiceiros deixaram o gado bandido fugir-lhe à aplicabilidade de um exemplo
que a todos devia presentear com o tilintar das reluzentes algemas a apertar os
braços dos crápulas que se juntaram para assaltos, falcatruas, negociatas e
armação de quadrilhas gigantescas.
O
carimbo deixou nos autos uma marca de classificação sumariamente indecente num
sistema de justiça que distribui prêmios para bandidos, artifícios legais que
jamais seriam estendidos a qualquer outro cidadão desse território de segunda
linha.
Cada
país tem a justiça que constrói. Deixa neste instante de ter qualquer sinal de
credibilidade, força vital de sua ação e coesão. Um poder que prefere aplicar a
justiça apenas a Jean Valjean que tentou matar a fome dos seus com um pão e
premia com regimes curtos ou inocências presumidas quem nem deveria sequer
escapar da forca se aqui fosse um lugar próprio para uma justiça do bem.
A
charge lá de cima bem ilustra não a máscara que a justiça pintou em seu próprio
rosto, mas de fato, a nossa cara... dos 200 milhões de bobos que souberam
assistir o rasgo provocado no tecido justicional brasileiro.
Um
dano que nunca mais será reparado nem que sejam escritos milhões de linhas jurídicas
que fazem nos enganar com seus roupões de linho preto e perfume de grife.
Pode
até ser que a justificativa fosse certo parágrafo de uma lei perversa que foi
elaborada exatamente por quem tinha culpa no cartório ou, quem sabe, uma “capivara”
(ficha policial) digna de gangster de Chicago durante o período da lei seca.
O
fato é que o crime compensou. Felizes os que foram convidados para essa festa
de Sodoma e Gomorra que a justiça brasileira patrocinou no golpe fatal do
último voto de Minerva, maldita Minerva.
Não
consigo me desvencilhar de achar que esse poder jogou-se sobre si próprio uma
lona colorida deixando espaço para muitos shows da justiça gorda e cabeluda que
lança seus malabares para o ar e tem um nariz imenso pintado de vermelho.
De
resto sobrou-nos a cara acima.