JORNAL PENA LIVRE

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segunda-feira, 29 de março de 2010

Julgamento pra quê?


Ivan Moreira
Advogado
IMA Advogados
 


Tive um dia excepcional ontem, realizei 90% da pauta programada. Estou melhorando, ou envelhecendo, antes não admitia algo abaixo de 100%. Dentre os 10% faltantes, não consegui ajuizar um ação de prestação de contas contra um banco do foro regional I, em Santana, capital, São Paulo, porque desconfiei que minha liberdade de ir e vir estaria prejudicada, e muito, pelo caso Isabela... Dito e feito. Segundo a imprensa, todo o entorno daquele Fórum estava tomado. Indiferente e a despeito de uma bela e desafiante lua crescente, recolhi-me mais cedo e liguei a televisão, no Jornal da Band, mais cedo que o Jornal Nacional.
Não demorou muito e veio a confirmação, não da lua crescente que não dá ibope, mas do caso Isabela. Entrevistaram, primeiramente, o Advogado de Defesa, que respondia às perguntas de todos os jornalistas. Solicitado pelo repórter da Band a responder a uma das perguntas, ao vivo, deu a este a devida prioridade (E pasmem: sem protesto dos demais jornalistas ali concorrendo! Que gente fina! Será mesmo possível?).  Não me lembro da pergunta e nem da resposta, mas sim da cena seguinte, o âncora Boechat entra no ar e antes do próximo quadro/notícia, adverte: – Mas essa foi a fala do advogado de defesa, há que se aguardar para ouvir o que tem a dizer o Promotor de Justiça.... Pensei comigo: “Não me diga, Mané!” ou “Of course, my horse!”  - Cenas seguintes, nova conexão com o Fórum de Santana, agora com o promotor de justiça no centro das atenções e etc.
Acabado o Jornal da Band, mudei para o Jornal Nacional (Aqui você tem que agir rápido, eles ficam todos de guarda para nenhum microssegundo se perder, um não começa sem o fim do outro)  - Pauta quase igual, quando, novamente surge outro pseudo-paladino da consciência judiciosa, agora a Fátima Bernardes, que, tanto quanto o seu colega Boechat, cuidou de mais uma vez advertir o elementar, vez mais em prejuízo da defesa, ou melhor: em sutil corrosividade ao que aparentemente serviria à dúvida e, portanto, à defesa. Cena seguinte: o registro de Glória Perez (novelista da rede Globo que perdeu uma filha assassinada) que compareceu no foro de Santana  para prestar solidariedade à família de Isabela (Poxa! Diz a mesma cobertura jornalística: a MÃE da Isabela está retida enquanto testemunha, a AVÓ de Isabela não se sentiu bem ao ver as “marcas da violência” no corpo da neta e abandonou o tribunal, com andar débil e amparada, não sem antes atender a toda a imprensa que ali se encontrava, clamando por justiça (ou vingança?), o PAI de Isabela é um dos réus. Qual a família que Glória Perez visitou? E por que a imprensa não mostrou estes familiares visitados?).
 Enfim, a quem interesse todo este circo e toda esta atenção? O que será que anda acontecendo em Brasília, às escondidas, para tão orquestrado desvio, previamente agendado, e que vai durar cerca de uma semana? E o clero? O que terá o clero a dizer sobre isso? Francamente... Como advogado, isso me fez pensar. Mal. É verdade que quando uma pessoa se encontra em situação de réu, por pior que seja a sua situação, depois de ser abandonada pelos amigos, colegas de trabalho, vizinhos, parentes, esposa e filhos, sobrar-lhe-á apenas o cachorro, o anjo da guarda e o advogado. Se “o cara” não é chegado num cão, pior, sobra o anjo da guarda e o advogado. Se “o cara” não é chegado num anjo da guarda (“Não acredito nessa coisa”) sobra-lhe ainda assim o advogado. Agora, se o cara não acredita, não precisa ou não confia no advogado, ele só não está mais “ferrado” porque a lei brasileira PROÍBE, impede, coíbe e veta um julgamento criminal sem defesa. Se acontecer, ou se for ela tão débil que equivalha à inexistência, é anulado o julgamento e outro deverá ser realizado.
Não interessa o quão apaixonada esteja a opinião pública (esta meretriz do mais baixo nível, mais volúvel que dinheiro, o qual só para onde é bem tratado...), é preciso de alguém que ainda não bebeu, uma pessoa sóbria para poder segurar o volante. Este é o Juiz. No caso, o Juiz Presidente do Tribunal do Júri. E este homem, ainda que também um homem, no tribunal do júri não é um homem; ou não é o homem, aquele cujos filhos e parentes tratam como gente, como pessoa. Ali, naquela presidência ele é pura razão. Razão legal. E até pode assim ser porque a judiciosidade ou consciência da decisão que vier, não é dele, mas sim do conselho de jurados. Por isso a incomunicabilidade destes; por isso a nenhuma importância dos “100% de certeza da culpa do casal” da delegada de polícia que cuidou do inquérito, porque ela não é jurada, graças a deus; e por isso, também, a falta de comportamento correto do vaidoso promotor de justiça junto à imprensa, fora do salão do júri, arrostando perguntas infantis (pobres jornalistas) sobre a aposta da decisão final com uma e sua “profunda e pessoal convicção” da condenação.  Ora Senhor dos Desgraçados! Não fosse bastante o meu dever de cidadão, o que por si só explicaria a presente perplexidade, um dia posso ser réu de um caso vultoso como este. Quem nos garante que este corpo de jurados esteja efetivamente incomunicável e alheio a este circo montado aqui do lado de fora do tribunal do júri? Quem nos garante que o Senhor Juiz de Direito Presidente do Tribunal do Júri está conseguindo manter a ordem a e a imparcialidade dos trabalhos ante tamanha cobertura jornalística que se dá ao caso, em rede nacional, e neste país continental?
Em que outra comarca deste país poderá ocorrer este julgamento se for requerido (e plausivelmente atendido) o DESAFORAMENTO deste julgamento por parcialidade do corpo de jurados? Qual é a defesa que pode com o Boechat e a Fátima Bernardes? Qual é a defesa, séria, que pode se realizar frente à imprensa voraz, insensata e indiscutivelmente indutora da opinião pública?  Qual a defesa de um linchamento, se linchamento pressupõe tudo aquilo que não permite defesa? De um lado, o arcabouço legal e jurisprudencial existente, garantindo o Due Process of Law  - Devido Processo Legal. De outro lado, o Estado corrompido por seus agentes, a volta do Leviatã de Hobbes, o Estado covarde, alimentado e usado pela imprensa, caricatura de sociedade, com uma delegada 100% convicta da culpa dos réus, ela, da “equipe” de um promotor vaidoso e convicto, que não parece assim tão convicto, enquanto exaure a capacidade física e mental dos jurados entrando no terceiro dia com as provas, APENAS DE ACUSAÇÃO, pouco restando de saúde dos jurados à defesa, que será também linchada se chegar ao seu segundo dia...
Só falta o infeliz presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, agora, alinhar-se aos linchadores e integrar esta massa, em detrimento da conclusão de um julgamento, de um julgamento justo, como fez com o caso do governador Arruda no Distrito Federal que, antes que me linchem, também, devo relembrá-los: ainda não foi julgado, a prisão dele é ainda a prisão processual e não a prisão-pena resultado de um exame de mérito  que a imprensa prostituta teima em não esclarecer, em gáudio desta massa medíocre, esta horda de bárbaros, encabeçada pela desfaçatez e uma imprensa que desserve à nação, à boa causa, à sociedade e ao direito, ao direito posto, positivo, vigente e aprovado.
DEFINITIVAMENTE: 
1) Testemunha o é do fato, e não da interpretação do fato;
2) A interpretação do fato é material de trabalho da acusação e da defesa;
3) A conclusão do fato é responsabilidade e prerrogativa do(s) julgador(es) e de mais ninguém;
4) Assim como um advogado não deve fazer observações sobre caso entregue à defesa ou representação de outrem, assim também não cabe a todos observar sobre julgamento afeito a algum(ns);
5) A opinião de um delegado, como a de um promotor, como a de um advogado, num julgamento, é tão irrelevante, ou quase tão irrelevante, quanto à de um jornalista ou de um especialista no assunto.
6) Tribuna de imprensa não é vara judicial;
7) A liberdade de expressão é maior que a liberdade de informação, ou de imprensa; e ambas não se sobrepõem à presunção de inocência, efetivo direito inscrito no capítulo dos direitos e garantias individuais da Constituição da República Federativa do Brasil;
8) A imprensa precisa ser responsabilizada pela sua voracidade e incúria no comprometimento da interpretação dos fatos, e os juízes já começaram a se acovardar, o que é mau prenúncio;
9) E, definitivamente: indício NÃO É prova, é indício; na dúvida, decide-se a favor do réu (in dubio pro reo); a ninguém é dado ser condenado por indícios, salvo em civilizações mais atrasadas das quais o Brasil já se superou, afora algum país vizinho que ainda outro dia, 23/3/2010, pôs na prisão um adversário político.

Uma nota, uma nota de curiosidade, mórbida: todos estes gastos, todo o circo e o salário dos seus “artistas”, estão sendo pagos pela população paulista. Indulgente ou subserviente esta? Uma segunda nota: merecemos qualquer sorte quando não nos manifestamos sobre os abusos nos direitos do nosso vizinho.

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